Interview with the poet Cláudio Bento - Jequitinhonha City - MG - Brazil


Numa tarde de carnaval estávamos, Yany Mabel, Luciano Silveira e eu, tomando uma cerveja na varanda do Hotel Bela Vista na cidade de Jequitinhonha, quando percebi que meus amigos encheram os olhos para alguém que passava pela rua. Acompanhado de sua esposa aparece Claudio Bento, uma figura com sorriso imponente que parecia iluminar o caminho por onde passava. Meus amigos se levantaram para abraçá-los, convidando-os a se sentarem conosco. Naquele momento eu percebi que se tratava de alguém muito especial. Minha impressão foi exata. Sempre que o via pelas ruas da sua cidade natal, era como se eu visse o vale do jequitinhonha inteiro, pleno, vivo, forte e abençoado. Tive muita vontade de conhecer melhor sua pessoa e sua obra e na cara dura convidei-o a ser entrevistado aqui no blog e ele prontamente, com sorriso largo aceitou. Estou muito feliz por poder presentear meus leitores com esta pérola rara, garimpada nas margens do rio Jequitinhonha em pleno carnaval.

(((((.))))) Cláudio, muito obrigado por ter aceito o convite e pela confiança de associar seu trabalho ao meu de forma tão carinhosa e urgente. Sinto-me um privilegiado. E espero que esta troca se extenda para outras instâncias. Então vamos lá? ... Gostaria de primeiramente saber um pouco da sua formação e da sua carreira de poeta. Como se deu o gosto pela poesia?

Clênio, não possuo formação acadêmica, minha formação se deu com muita leitura de livros, com o gosto pelo cinema e pela boa arte. Minha carreira com a poesia iniciou-se no início da década de oitenta quando publiquei meu primeiro livro, feito no mimeógrafo e daí em diante passei a ser conhecido no meio literário do Vale do Jequitinhonha, onde conheci poetas como José Machado de Matos, Tadeu Martins, Gonzaga Medeiros, Adão Ventura e Wesley Pioest. O gosto pela poesia se deu ainda nos bancos escolares em um tempo que havia leitura de poemas nas salas de aulas, foi aí que bebi da poesia de Casimiro de Abreu, Cecília Meireles, Vinícius de Moraes, Castro Alves e outros poetas brasileiros.

(((((.))))) Cada artista possui uma rede de amigos, artistas favoritos, lugares favoritos, etc. que os inspira a criar. O que emociona e inspira o poeta Claudio Bento?

O que me inspira a escrever primeiramente é o hábito da leitura, quando leio exercito mais o ato da escrita, hoje trabalho muito com a intertextualidade que é uma prática comum na literatura que se faz hoje no Brasil. Também nas oficinas literárias que ministro trabalho essa tendência, que é muito interessante e de certo modo valoriza e resgata a obra de outros escritores e poetas.

Meus lugares favoritos eu diria que o Vale do Jequitinhonha é a minha ternura de infância, principalmente a cidade de Jequitinhonha, onde nasci e criei-me nas praias, nos becos, nas ladeiras e ruas, vendo toda a forte manifestação cultural que a cidade oferecia, o boi de janeiro, a folia de reis, o carnaval, o futebol, as lavadeiras na beira do rio, os tropeiros, os pescadores, as carpideiras, os penitentes, as rezadeiras, enfim, uma riqueza cultural que marcou-me para todo o sempre e que de certa maneira inspirou-me a criar minha bagagem poética.

Meus artistas favoritos poderia dizer que admiro os grandes nomes da mpb, Caetano, Chico, Gil, Gal, Bethânia e tantos outros nomes que ajudam a entender o nosso país. Na poesia admiro os poetas Ferreira Gullar, Wally Salomão, Adélia Prado, Mariana Botelho e Hilda Hilst.

(((((.))))) Há diferenças entre o Claudio poeta, artista, gestor cultural e o Claudio marido, cidadão, vizinho, etc.? Quais são estas diferenças? Como você administra essa relação?

Sou um cara simples do Vale do Jequitinhonha e minha relação de poeta e cidadão não difere muito da minha relação com vizinhos ou com a minha família. Sou um agente cultural que luta por causas que acho justas, a luta contra as injustiças sociais, a luta pela valorização da cultura em geral, a luta pelos direitos humanos.

(((((.))))) É isso mesmo que penso Claudio, vivemos num momento que não dá mais para separar a arte da vida. Entendo a vida dos grandes artistas das massas, esses sim necessitam de uma lacuna entre a fama e o afeto, para própria segurança, né? Mas o artista cru, genuíno, está sempre no meio, como na terceira margem do nosso grande Guimarães. E entre Arte e Saúde. O que você pensa sobre esta relação?

Arte já é saúde, uma maneira de fazer um mundo melhor, agora o cidadão tem de cuidar do planeta, do meio ambiente, do meio em que vive, cuidar da saúde dos rios e dos oceanos, da rua que a gente vive, preservar a natureza para construir um mundo melhor.


(((((.))))) Como é a sua rotina criativa?

Minha rotina criativa é um tanto relaxada, o impulso criativo para a escrita de poemas se dá de maneiras diversas, dentro do ônibus, do barco, do avião, na rua, no quarto ou dentro do cinema. Houve um tempo em que andava sempre com caderneta e caneta no bolso, hoje nem tanto, fiquei mais seletivo, não escrevo tanto quanto escrevia há dez, quinze anos atrás, mas costumo reunir um volume de poemas, dar título e procurar um jeito de publicar, que é a parte mais difícil para um poeta independente.




(((((.))))) Imagino colega rs. Eu também passo por isso e acredito que todos os artistas independentes de hoje passam pelas mesmas dificuldades. Claudio, mais uma vez obrigado pelas idéias que você compartilhou conosco. E para terminar gostaria que você falasse pra gente um pouco sobre o que você está aprontado no momento?

No momento penso em publicar um pequeno volume de poemas em homenagem aos artesãos do Vale do Jequitinhonha. Este também é um momento que estou mais engajado na luta cultural fazendo parte da diretoria do Instituto Valemais, que é uma espécie de ong que promove e divulga a arte do vale do Jequitinhonha. Também acabei de assumir a presidência de uma associação em prol da cidade de Jequitinhonha, uma associação que busca proventos para pessoas carentes da cidade.



(((((.))))) Maravilhoso né gente? Pedi ao Claudio para me enviar alguns poemas para eu publicar aqui junto com a entrevista, e ele me autorizou a usar qualquer um do seu blog. Escolhi dois poemas que mais gostei, desenhei no paint, tratei no photoshop, de forma bem simples como adoro, simplicidade que retrata perfeitamente a obra deste poeta. Quem quiser saber mais sobre o Claudio, entrar em contato, etc. é só entrar no seu blog clicando aqui >>CLAUDIO BENTO<<. Um abraço a todos. Deliciem-se com os poemas. E até a próxima!



AS MAIS SIMPLES PALAVRAS

Minha poesia é simples

E cheia de palavras simples como


Vale peixe rio canoa

Pedra seixo barro areia


Terra planta àgua praia

Beira beirada barranco barranca


Remanso rebôjo ribeira ribanceira

Vida viola vereda varanda

Jenipapo graviola graveto gravatá


Presépio perau pitanga procissão


Chuva quintal vento argila

Remo escaler madrugada solidão

***



MENINO SENTADO NA CANOA

O menino ficava sentado na canoa

Sob o sol quente do verão

O rio passava entre pedras

As lavadeiras lavavam roupa cantando


Contando histórias

Metendo as mãos na panela do dicumê


No céu de um azul de doer os olhos

Um bando de ariris fazia festa


Alzira de Nato dizia que era a chuva que estava perto

Lôi de Primitivo retrucava que era algazarra daqueles pássaros


O menino na canoa sorria com os pés mergulhados na àgua

Sonhando com a chuva

***
(((((.)))))

3 comentários:

m. o. disse...

Dei moral pro cara ;x
Simpatizo com quem dá valor pra terra, principalmente se for interior ^^

Anninha Soares disse...

O Cláudio Bento é mesmo um grande poeta, que retrata com toda beleza própria da simplicidade do nosso amado Vale o lidar de todos os dias desse povo tão guerreiro. É como vc mesmo disse, Clênio, ele é um artista genuíno que está sempre no meio de tudo que é arte e cultura popular no Vale do Jequi.

cleniomagalhaes.blogspot.com disse...

...que bom que vocês gostaram. como disse marimprovavel eu dou moral pro cara. começar com um livro mimeografado, é super atual essa idéia. alternativo, econômico e ao mesmo tempo valioso. espero que o blog sirva para ligar muita gente à sua poesia...
obrigado pelos coments!
divulguem!