(des)encontro



o fato de se ter encontrado no meio do caminho uma forma pela qual a calma da minha solidão pode ser perturbada e a nova vida tornada despretensiosamente plena de anseios vigorosos de amor, tornam questionáveis cada segundo do meu pensar. o estado em que me encontrava antes do encontro era a minha tentativa de manter meu coração protegido do frio da saudade. incansavelmente eu o mantinha aquecido pela força do meu trabalho. não podia nunca entristecer-me pois encotrava-me sempre cansado e com um enorme desejo de estar comigo, em meu apartamento, em meu caos, em meu travesseiro. mas o encontro, no meio do caminho apresentou-me uma humilhante forma de provar a insignificância do meu canto. meu coração iludido, voltou-se contra meu ritmo e pulava neuroticamente dentro do meu tronco a buscar uma maneira de fugir de mim e cair nas mãos do apresentado. engoli seco pois todo meu líquido tornou-se lágrima de piedade do meu peito. meu coração tossia desidratado soprando para minhas veias um pó vermelho que me dava medo. medo de não encontrar pelo meu caminho deserto um copo de água limpa, um travesseiro e um livro de poesias para hidratar o fio que liga meu corpo ao meu espírito. maldito encontro escondido em meu corpo, em meus ossos. sinto frio. não chega a ser uma saudade pois guardei nada de tudo que não vivi daquele maldito encontro.meus planos porém são do tipo de cortar pela raiz a valentia deste encontro a ponto de exibir na volta do caminho deserto a melodia calma e descompassada do meu coração saudoso pelo meu travesseiro. na falta de trabalho pelo caminho, correrei em vão, cantando nossa frenética música predileta, fazendo com que ele bata forte, mais forte do que quando se depara com os resíduos perdidos do encontro ao passar por suas artérias. meu coração perceberá assim que juntos continuaremos nossa jornada sem precisar de encontros que nada nos podem oferecer além de unhas, pêlos e odores que naturalmente são expelidos de sua grossa casca.

imagem e texto: clênio magalhães

a impossível classificação da arte contemporânea

este pequeno artigo representa uma inquietação particular quanto aos inúmeros questionamentos sobre o que seja essa arte contemporânea que vem ganhando a cada dia mais espaço no mercado cultural mundial. geralmente as obras contemporâneas promovem tensões interpretativas por localizar-se no campo do desconhecido. na fruição da arte contemporânea encontram-se alguns entraves gerados pela ausência de identidade percebida pelo receptor. essa identidade inexiste ou existe em mínimas proporções por vários motivos, dentre eles posso citar: a massificação cultural promovida pela imprensa, pela ausência deste conteúdo na educação escolar e pela insistente classificação desta modalidade inclassificável. o primeiro motivo provoca uma padronização da arte fazendo com que o público busque reconhecer e não criar novas interpretações, o segundo não assegura a vastidão do vocabulário sensitivo da arte na criança, queimando fases que serão necessárias para a fruição da arte na idade adulta e o último por tentar definir algo que sempre estará em mudança em todos os aspectos. sem querer classificar, mas apenas expondo minha maneira de relacionar-me com a arte, diria que a arte contemporânea representa a arbitrariedade das escolhas, onde corpo e mente fundem-se em mito. a alteridade é responsável pela variedade de critérios utilizados para realização de uma análise taxonômica da arte contemporânea. a arte contemporânea não carece de definições pois o fenômeno de afetação pela arte acontece de forma axiomática. a variação da capacidade sensitiva da obra ocorrerá de acordo com as diferentes experiências que este receptor já vivenciou. todo público está preparado para receber uma mensagem artística, porém a densidade e a dispersão dos conteúdos variam de acordo com a cultura. acredito que seja pertinente atender ao público contemporâneo oferecendo-lhe informações acerca da permissividade de diferentes formas de percepção e talvez a maior responsabilidade esteja nas mãos da educação que é responsável por preparar a criança para as mudanças do mundo e não somente reproduzir a arte enlatada dos meios de comunicação. neste aspecto a arte-educação exerce um papel importantíssimo no que tange à construção de uma nutritiva base sensorial de percepção artística para fomentar o consumo de arte para gerações futuras.

lugar de encontrar o outro



o projeto 'lugar de encontrar o outro' programação integrante do 'enarcti 2008' promovido pela °hibridus° de ipatinga (mg), está em governador valadares quebrando definitivamente todos os limites impostos pela necessidade de conceituar a arte.

no dia 13 de junho de 2008 o grupo nos proporcionou uma curiosa experiência no templo ecumênico do campus 2 da universidade vale do rio doce com sua mais recente pesquisa cênica denominada 'entre' que confirma esta ausência de bordas nos fundamentos artísticos.

tv,câmeras fotográficas e filmadoras, sapatos, telas de proteção para construção civil, cheiros, gostos, sons e sensações. todos esses elementos se fundem numa espécie de humus fertilizante dos sentidos.

não há o que questionar. o grupo hibridus justifica sua caótica estética em sua infinita incompletude, assumindo uma condição 'em construção'. não há possibilidade de sentir-se seguro ou confortável, assim como quando adentramos num edifício em obras, onde só podemos imaginar como ficará cada espaço após o acabamento.

por conhecer um pouco mais sobre a história do grupo, consigo enchergar em 'entre' uma forte influência:
-do ritmo acelerado dos dias (família, faculdade, amor, economia, fé, ciência..)
-da atmosfera de super produção da cidade de ipatinga (progresso que necessita de cautelosa análise)
-da diversidade dos jovens componentes em busca do futuro (arquitetura, história, fisioterapia, fotografia..)
-da colaboração dos inúmeros intercâmbios entre profissionais de arte contemporânea (enartci)

as indefinições surgem pelo fato de que a marca mais forte dos seus trabalhos seja justamente a efêmera paisagem urbana. os trabalhos do grupo hibridus, permitem-nos perceber com mais sensibilidade como o progresso, diariamente, exerce influência sobre o nosso desenvolvimento físico e psíquico e nem sempre damos conta disso no presente.

embora a obra permita a participação de 100 pessoas por sessão, tivemos em valadares aproximadamente 25 pessoas. 1/4 de aproveitamento é baixo, mas considerando todo o distanciamento da vanguarda artística no interior mineiro, acreditamos que seja um número satisfatório e nos dá a esperança de um breve crescimento.
o 'lugar de encontrar o outro' deixou saudades.
galera hibridus, agradecemos todo o profissionalismo dedicado à nossa platéia e aguardamos ansiosos um retorno.