Figura 1: Paintbrush sobre Jean-Georges Noverre
A DANÇA NA PRÉ-HISTÓRIA
(1.000.000 a.C. ao Século V)
Devido a grandes revoluções humanas a dança sofreu grandes transformações, desde seu "surgimento". Devido a marcante presença da expressão corporal em seu processo de desenvolvimento, a dança acompanha a cultura de cada época. Valores, crenças, hábitos e comportamentos de cada fase histórica da humanidade refletem no fazer em dança demonstrando seu aspecto político e co-criador da realidade.
Quando pensamos em dança, temos uma ideia de dança, uma concepção particular do movimento conhecido cultural e artisticamente como dança em determinada época. Essa ideia de dança é pessoal e intransferível, pois mesmo em coletivos culturais, ao contar ao outro qual é a sua ideia de dança, esta já se transforma em outra dança, carregada de valores de quem a experienciou e a transferiu como conhecimento. Há de se imaginar que a ideia de um movimento transcendente foi sendo transmitida de geração em geração e sendo chamada de dança, do alemão dintjan que se refere ao movimento de um lado para o outro.
O homem pré-histórico imitava o seu cotidiano e adorava o que julgava sagrado ou desconhecido em forma de cultos ritualísticos. A ideia de dança do homem pré-histórico, certamente surgiu a partir da sua observação da natureza e a tentativa de se apropriar dela através da mímica. As pinturas rupestres registram em diversos momentos homens e animais juntos como numa espécie de ritual. Era comum também a adoração ao sol, chuva, lua, vento, água, fogo, etc.
Cada comunidade tinha a sua maneira peculiar de adorar estes fenômenos da natureza e cada elemento trazia em si a sua subjetividade que nos corpos humanos geravam uma unidade simbólica e harmônica. Dançar ao redor de uma fogueira é uma atividade individual e coletiva ao mesmo tempo como numa oração. A dança funciona em nosso corpo como um sensor capaz de captar uma diversidade de estímulos como ritmos, emoções e sensações. O homem contemporâneo continua imitando a natureza, porém de maneira muito mais diversificada e artisticamente elaborada do que na pré-história, frente ao fato de que a natureza também passou e passa por intensos processos de transformação.
Figura 2: Pinturas rupestres do Abrigo São José da Lagoa acessado em www.researchgate.net
Período Paleolítico: 1.000.000 a.C.
População nômade.
Danças Circulares, Danças de animais, pouco contato físico.
Período Mesolítico: 15.000 a 10.000 a.C.
Domínio do Fogo.
Dança de máscaras, Dança Coral, Danças lunares e Danças fúnebres, com contato físico.
Período Neolítico: 10.000 a 3.000 a.C
Desenvolvimento da Agropecuária.
Dança aos pares, Dança do Ventre.
(Transição)
Danças astroteológicas 2000 a.c
• homenagem ao deus Osíris (Egito)
• danças vinculadas aos jogos olímpicos (Grécia)
DANÇA NA IDADE MÉDIA
(Séc. V a XIV)
Muitas danças foram proibidas pelo Cristianismo por apresentarem movimentos sensuais, sobretudo as chamadas Danças Teatrais. Os povos, sempre empenhados em resgatar e preservar seus valores culturais, praticavam às escondidas estas danças em feiras e aldeias. No século XIV na Europa o povo dançava freneticamente nos cemitérios por terem fé no poder da dança de exorcizar demônios. Durante este período, ainda predominou as Danças de Rodas. Nestas danças os dançarinos formam um círculo, dão as mãos uns aos outros, às vezes soltam, batem palmas, batem os pés no chão, em sentidos horários e anti-horários, com as mais variadas evoluções de pares (homens e mulheres). A dança de roda é a dança mais simples e mais popular do mundo. Seu estilo mais famoso na Europa denomina-se Carole. No Brasil essas danças foram trazidas pelos portugueses para comemoração da época das colheitas, porém os povos indígenas já as praticavam de maneira ritualística.
Renascimento (Séc. XIII a XVII)
Danças Teatrais, Danças Cortesãs e Danças Palacianas como a Valsa e o Minueto. O Minueto marca a passagem da dança em grupo aos Bailes. Esta dança possui compasso 3/4, de origem francesa. Seu nome significa (menus) Dança de passos miúdos. Os músicos que se destacaram nesta forma foram Bach, Mozart, Beethoven, Paderewski e Haydn.
Romantismo (Séc. XVIII a XIX)
Nesta época, nobres italianos presenteavam seus convidados com espetáculos de dança, música, teatro e artes plásticas, com ricos cenários e figurinos desenhados por ilustres artistas como Leonardo Da Vinci. Esta formatação de espetáculo deu origem ao que conhecemos hoje como Ballet Clássico. O primeiro espetáculo registrado com o nome de Ballet ocorreu em 1489, comemorando o casamento do Duque de Milão com Isabel de Árgon. A dança ganhou técnica, estilo e popularidade, surgindo então seus especialistas e professores. Os professores de Dança tornaram-se famosos em todo o mundo que eram contratados para ensinar danças para os mais diversos eventos como casamento, vitórias em guerras, alianças políticas, etc.
Quando Catarina de Medici casou-se com Henrique II e se tornou rainha da França, introduziu com sucesso o Ballet em seu país. Sucesso que perdura até os dias atuais. O Ballet tornou-se uma regularidade na corte francesa que cada vez mais o aprimorava em técnica e beleza. O auge de sua fama ocorreu quando Luís XIV, que foi rei aos cinco anos de idade, iniciou seus estudos no Ballet. Ele amava a dança e aos doze anos de idade já era bailarino da corte. Foi ele o fundador da Academia Real de Ballet em 1661.
Figura 3: O Rei Sol Luis XIV acessado em https://sites.google.com/site/evelyntosta/
No fim do século XVIII, Jean-George Noverre inaugurou o “Ballet de Ação”, que constituía-se de estórias com personagens como nas Pantomimas (Teatro Gestual de Origem Grega Século IV a.C.).
No século XIX, o Romantismo transforma o Ballet, exibindo em seus espetáculos figuras exóticas e etéreas com sombras, espíritos, fadas e bruxas, contrapondo aos heróis e heroínas até então representados. Em 1847 há um declínio do Ballet na França, levando Marius Petipa a se mudar para a Rússia. Neste país o Ballet estava em ascensão devido aos investimentos feitos pelo Czar. Marius Petipa foi o criador dos três mais importantes ballets do mundo: A Bela Adormecida, Quebra Nozes e o Lago dos Cisnes. Em 1909, Petipa foi considerado ultrapassado, sendo substituído pelo coreógrafo russo Serge Diaghilev que revelou grandes nomes como Ana Pavlova, Tamara Karsavina e Vaslav Nijinsky como intérpretes e Michel Fokine como coreógrafo. Em 1911, o Ballet Russo determina o surgimento de uma nova era do Ballet mundial.
A DANÇA MODERNA
(Séculos XIX e XX)
A virada para a dança moderna dá-se com a estréia da peça A Sagração da Primavera (1913, Théâtre dês Champs Elysées – Paris. ). Vaslav Nijinsky como coreógrafo e Igor Stravinsky como compositor musical, ambos russos, propõem ideias inovadoras e radicais que provocaram vaias na noite de première. Os movimentos de Nijinsky eram diferentes para a época devido a alteração do vigor e direção dos membros inferiores e superiores. Bater os pés no chão com força, contrair a musculatura, virar os pés para dentro, tocar-se, eram ações muito fortes e radicais até então nunca vistas.
Figura 4: Sagração da Primavera by Nijinsky acessado em: classicosdosclassicos.mus.br
Na américa, Isadora Duncan também desenvolvia sua maneira inédita de dançar e também conquistava Paris. Foi ela a grande pioneira do modernismo da dança, marcando o fim da hegemonia do balé clássico. As principais características da dança moderna foram determinadas pelas pesquisas de Isadora Duncan que defendia a individualidade artística do dançarino. Pés descalços, túnicas transparentes, soltas e longas, movimentos livres, completamente contra os padrões clássicos, movimentos conectados à natureza e ao ar livre, o sentimento comanda o gesto, linguagem do corpo inteiro, ruptura da linha melódica, realismo psicológico, efemeridade da obra, os problemas e angústias da época na criação artística, constituem as principais características da dança moderna difundidas por Isadora Duncan e seus seguidores.
A dança moderna no Brasil chega em 1932, com Ruth Rachou, especialista na técnica de Martha Graham e também na técnica de Pilates. Teve como desafio difundir a técnica de Martha Graham no Brasil, pois a dança cênica do país encontrava-se muito fixada no ballet clássico.
PRINCIPAIS NOMES DA DANÇA MODERNA
Isadora Duncan (1877-1927)
“A dança que eu criei não é outra coisa senão a expressão da liberdade.”
Dançarina, coreógrafa e educadora norte-americana, foi figura fundamental para a dança do século 20. Fazer gestos naturais, andar, correr, saltar, mover seus braços, reencontrar o ritmo dos movimentos inatos no homem, perdidos há anos, escutar as pulsações da terra, obedecer às leis da gravitação, feitas atrações e repulsas e conseqüentemente, encontrar uma ligação lógica, onde o movimento não pára, mas se transforma em outro, respirar naturalmente, eis o seu método. Desprezava o figurino, usando apenas túnicas esvoaçantes e transparentes que horrorizavam o público acostumado ao luxo e a exuberância do romantismo. Para Isadora a dança deveria expressar sentimentos através do corpo e do espírito.
Martha Graham (1894-1991)
“Quero falar sobre os problemas do século onde a máquina perturba o ritmo do gesto humano.”
Para ela, a respiração é o ponto fundamental da dança, desenvolvendo a primeira técnica de dança moderna no mundo. A técnica de Martha Graham consiste na combinação de contrações musculares, respiração e sentimentos. O tronco é o centro do movimento que se expande para as extremidades, a emoção comanda a ação e a interrupção do movimento no auge de sua transcendência, provocando no espectador uma dedução da sua total conclusão. Suas coreografias falavam de problemas do mundo como a guerra, o desenvolvimento tecnológico em detrimento do corporal, as profundezas da alma, o desconhecido do ser.
Rudolf Von Laban (1879-1958)
Pioneiro na sistematização prático-teórica do movimento. Defendia o movimento como denominador comum de todas as ações humanas. “Deve-se aperfeiçoar o conhecimento da organização e o sentido da qualidade das unidades de movimento, com frequência criadas livres e espontaneamente, de maneira que nossas ações físicas se tornem específicas o bastante para permanecer impressas em nós e se possa criar uma experiência psicofísica do movimento.” Criou um sistema de notação do movimento, chamado Labanotation dentro da noção de espaço de um icosaedro (poliedro de 20 faces), estabelecendo quatro fatores que dão qualidades diversas aos movimentos: tempo, espaço, peso e fluência.
Figura 5: Rudolf Laban acessado em https://brunapovoa.wordpress.com
A DANÇA CONTEMPORÂNEA
A dança contemporânea não se define em técnicas ou movimentos específicos. A autonomia corporal para construir suas próprias movências a partir de métodos e procedimentos de pesquisa diversos, dá à pessoa o poder de realizar suas composições a partir de temas relacionados a questões políticas, sociais, culturais, autobiográficas, comportamentais fisiológicas, biológicas, anatômicas, etc. Geralmente as manifestações contemporâneas em dança promovem tensões interpretativas por localizarem-se num campo de conhecimento aberto e efêmero. Na fruição da dança contemporânea encontram-se alguns entraves dentre os quais podemos citar ausências de identificação com sua natureza transgressora.
Os meios de comunicação mais abrangentes podem provocar uma padronização da dança contemporânea fazendo com que o público de determinado período/região busque reconhecer padrões em detrimento de criar novas diversas formas de encontrar a dança. A educação das artes nas escolas ainda não assegura a vastidão do repertório de ações da dança contemporânea para a criança, comprometendo a sua relação com essa manifestação artística na idade adulta.
Sem querer classificar, mas apenas expondo minha maneira de relacionar-me com a dança contemporânea, diria que esta representa a diversidade da motricidade humana, onde corpo e ideia fundem-se em mito.
Figura 6: Francis Baiardi (AM) coreografia Apoena acessado em www.portalmarcossantos.com.br
A dança é uma forma de comunicação e expressão, logo manipula códigos, produz signos e através destas elaborações constrói o seu discurso. Na linguagem falada brasileira por exemplo usamos as letras, números e sinais gráficos e a combinação destes signos gera a comunicação verbal. Na dança o MOVIMENTO elaborado ganha FORMA no ESPAÇO-TEMPO constituindo assim sua estrutura fundamental. O movimento é o principal elemento da dança que combinado a outros elementos gerará os inúmeros estilos de dança que conhecemos. Nenhum movimento é igual a outro, pois estes são afetados por outros três elementos que o diversifica. O movimento acontece em um TEMPO, em determinado ESPAÇO com uma determinada FORMA. Ou seja, o que vai diferir um movimento de outro são as diferentes composições a partir da tríade ESPAÇO-TEMPO-FORMA.
ESPAÇO - interno, externo, baixo, alto, médio, por fora, por dentro, etc.
Interno: em relação ao corpo humano podemos nos referir às vísceras, nervos, carnes, ossos e células, bem como o pensamento, as idéias, intimidade e subjetividade. O espaço interno da dança compreende o campo das idéias.
Externo: o que é exterior ao corpo, além da pele, percebido pela superfície dos objetos, os planos e níveis.
TEMPO: em relação ao corpo temos a idade, o temperamento, o ritmo. Na dança temos a época, o andamento, o prazo, o intervalo, o ritmo.
As danças podem acontecer com ou sem música, mas seus andamentos poderão ser ritmados ou arritmados.
Época: Uma dança pode ser tradicional (Flamenco), clássica (Ballet), Contemporânea (Intervenção urbana).
Ritmo: Em músicas os compassos são divididos em tempos fortes e fracos, curtos e prolongados, formando variados ritmos como binário (2x2), ternário (3x3), quaternário (4x4) e compostos como (5x7), (3x8), etc. Exemplo de tempo binário temos o Samba, e ternário temos a Valsa.
FORMA: Nenhum corpo é igual a outro pois existem pessoas brancas, negras, amarelas, vermelhas, bitonais, baixas, altas, gordas, magras, médias, fortes e delgadas. Uma vez que é o corpo quem movimenta na dança logo nenhum movimento será igual a outro pois ele poderá ser forte, fraco, curvo, reto, contínuo, interrompido, parcial e total. Quanto à forma podemos classificar o movimento como:
Total: todo o corpo se move.
Parcial: partes isoladas do corpo se movimentam enquanto outras mantêm-se externamente estáticas.
Contínua: é difícil distinguir onde começa e termina o movimento devido à sua fluidez.
Interrompida: o percurso do movimento é interrompido por pausas provocadas pela contração dos músculos.
Curva: o percurso do movimento desenha no ar linhas e formas curvas.
Reta: as linhas do corpo formam ângulos e planos com o solo, paredes, cenários, etc.
No processo de criação coreográfica várias combinações destes elementos podem se dar simultaneamente sem que sejam necessariamente percebidas e categorizadas. Numa determinada improvisação de movimentos, partes diferentes do corpo podem executar movimentos com qualidades completamente opostas ou complementares. Rudolf Laban, um dos maiores estudiosos do movimento da dança, apresenta em seus estudos de movimentos diversas outras qualidades de movimento em forma de ações como pontuar, chicotear, socar, alisar, etc.